quarta-feira, 26 de abril de 2017

Concílio por Afrodite (2ª parte)

A erudita deusa apreensiva,
Tentou a sua última investida,
Antes da escolha da irmã, decisiva,
E que para as almas era merecida.
“Minha irmã! Os sentimentos são severos
Quando não são correspondidos.
Faz-te acompanhar por Anteros
Para que não hajam corpos iludidos.”

A irmã do amor parou e refletiu,
Expôs a sua vontade ao pensamento;
E nisto, conclusiva, anuiu
Que seria isso importante ao sentimento.
Na investida, Anteros viria a servir
Mais tarde do que a sabedoria o pedira,
E por isto Atena tentou intervir,
Mas do excelso trono Zeus a impedira.
   
“Oh meu majestoso pai!
Porque me não deixaste intervir?
Aos pés da desilusão toda a alma cai,
Não há deus nem alma que a possa destruir!”
Zeus olhou do alto, abaixo de seus pés
E clamou: “O momento não é agora!
Como erudita que és
Saberás quando é a hora!”

Eros mirou certeiro
E a flecha se soltou;
Fez de dois seres um inteiro,
No peito de cad’alma entrou.
É o momento em que o sentimento eclode,
É uma razão que muito se escusa,
É agora que o coração explode,
É agora que o olhar se cruza.

As almas param no passeio,
No Olimpo todo o deus se cala,
As almas descartam o receio
Pois agora, só o coração fala.
Devem saber as almas, ao sentir,
Que o amor não é conceito!
É o que faz realistas iludir,
É o que faz dos deuses o preceito!

Afrodite, sua vitória vociferou
Por meio dum sorriso silencioso.
Olhou mais alto, e o peito apertou,
Mostrando aos deuses o seu querer ocioso!
Atena não desmontou a expressão,
Não se lhe foi roubado o saber.
Voltou costas aos céus, sem emoção
Regressou à terra, ao lar do seu dever.

Todos os deuses voltaram à divindade,
E muitos foram sem o ir de pensar;
Afrodite ficou olhando a mortalidade,
Ficou pensando em ao passado regressar.
Sentiu a pele tocada pelo adultério,
Sentiu do guerreiro, as mãos, a percorrendo,
Sentiu o tom repreensivo do minério.
Amor, desejo, carne e prazer em si ardendo!
  
Queria ela alastrar a sua dor,
Para que todos, possíveis, sentissem o que sentiu,
Queria infiltrar nos seres a chaga do amor,
Pra ver de fora como o amor lhe mentiu.
Por isto, Ares não retornaria
Não voltaria o amor da imortalidade,
De novo ele não a despiria,
Não fariam de seu sonho a realidade.

Por fim, Citereia as costas voltou,
Deixando este fado decorrer,
Este amor por fim tolerou
Para que nenhum deles viesse a perecer.
O Olimpo não se esvaziou
Não se recolheram todas as potestades!
Um destino novo, para os mortais, fantasiou
O submundo, morte e dor do malogrado Hades.

quinta-feira, 6 de abril de 2017

Concílio por Afrodite

E no Olimpo acima dos céus,
Sentado no trono colunado,
Está o majestoso, imponente Zeus,
Glorioso ele, de rosto iluminado.
Olha outras divindades discutindo,
O que do fado querem fazer;
E dos outros! Estão dos outros decidindo
Como os seus rios vão correr.

Afrodite, esbelta e magna
Olha do alto os mortais míseros
E o seu olhar neles estagna.
Ao seu lado, sentado, está Eros,
A criança que mais amor criou,
O adulto que racionalistas iludiu
O adolescente que corações ligou
Ele, a loucura que sãos invadiu.

“Observa homem alado!
Olha o passeio citadino, invadido
E quase nu, de solidão povoado.
Tens lá almas com o coração despercebido!”
Disse Afrodite, receando invasões,
Que desnecessárias fossem aos seres;
Não queria o risco de malignas emoções
Nem tampouco exceder os seus poderes.

“Diz-me o que queres!
Diz-me o que devo fazer!
Não deixes que vão, não esperes
Não deixes a oportunidade desvanecer!”
Observando, num recanto,
Estava Atena, imponente e racional
Ignorando das “sereias”, o canto
Resistindo à tentação emocional.

“Afrodite!”, vociferou
A deusa da sabedoria
Pois sua mente se alarmou,
Para o que sua irmã despertaria.
“Não cries nas almas amor,
Pois se o rio não correr
Ouvirás longe o seu clamor,
Implorando, para que faças tudo perecer.”

“Oh minha irmã sapiente!
As almas feitas são para sentir.
E sossega! Toda a alma é contente
Quando por mim se deixa invadir.
Não há perigo, não há receio
Não há sustento à preocupação!
O seu oco ficará cheio,
Se erradicará a escuridão!”

“Erradicar-se-á a escuridão,
Preencher-se-á o interior,
Mas as almas abandonarão a razão
E a sua mente não terá valor.
O pensamento nato só irá despertar,
Quando a desilusão os invadir,
No momento em que a aliança se desfragmentar,
Quando o chão aos seus pés se abrir.”

A distância nos passeios decrescia,
As almas estavam-se a aproximar,
O tempo do encontro diminuía,
Estava perto o cruzamento do olhar.
Citereia, insuflada de vontade
Pediu a Eros para apontar,
A flecha da benigna mortandade,
A linha do novo fado a traçar.

(Continua...)